Crédito da imagem - site Virginia Tech

 

Interessados em vinhos recém-apaixonados pelo assunto costumam se deparar com problemas tentando aprofundar conhecimentos. O auto-didatismo funciona até certo ponto mas é imperativo que em algum momento tenha de recorrer à terceiros, parte do aprendizado: uma confraria, instituições de ensino básico e práticas de degustação ou seguir uma “cartilha” de profissionais que em geral são bem expostos na mídia, com programas de TV ou cinema, jornais, revistas e que compõem um “marketing do vinho”. Até aí nenhum problema, mas como o mundo dos vinhos é também um grande mercado, preocupações comerciais podem ferir princípios e códigos de valores que confundem o consumidor final. A sociologia de Max Weber permite aqui a distinção entre ideólogos e expertos que seguem respectivamente uma ética de convicção e outra de responsabilidade. Os apresento brevemente inserindo-os no contexto.

Ideólogos: fundam sua capacidade persuasiva na afirmação de valores que devem sustentar custe o que custar. Fornecem princípios-guia, são formadores de opinião e manipuladores de idéias. Fazem escolhas por você (claro que segui-lo é uma opção).

Expertos: dirigem a ação conforme um objetivo ou consequência, fornecem conhecimentos técnicos e meios de fomentar novas idéias e alcançar um objetivo proposto. Podem ser manipuladores de dados, não de idéias. Lhe ensinam a escolher.

Está sempre na pauta de enófilos, a dialética sobre a importância, legitimidade ou necessidade de indivíduos ou corporações de atitudes messiânicas, ou seja, que supõem serem detentores da verdade sobre o consumo de vinhos e agindo como ideólogos induzem à uma opinião, que lhes são próprias. Pode ser o crítico de vinhos que determina que um vinho A é melhor que B ou o comerciante de vinhos que afirma que somente ele vende os vinhos que agradam o seu consumidor e etc. A origem do problema não está na presença deles em si, mas que suas próprias existências são dependentes da desinformação  pública. Então podem baseando-se nos conhecimentos que possuem, disseminar e quase sempre “vender” suas idéias de consumo. Antes um Messias inculcava ideologias e hoje numa ética de auto-preservação econômica, exorta hábitos de consumo. A ética da convicção se transforma numa ética comercial de índices de eficiência. O consumidor potencial deseja melhorar seus hábitos e é lançado a um jogo que desconhece as regras. Se comporta involuntariamente, ao adotar um Messias, como o “espírito cativo” de Nietzsche que se declara cristão não porque conheceu e optou pelo cristianismo numa diversidade de religiões, mas por hábito. Ele não assume uma posição por esta ou aquela razão, mas o faz justamente por ausência ou recusa em inquirir razões. Aqui, mesmo quando não há violação da ética em vista da intenção comercial, o caminho para o aprendizado pode ser mais tortuoso.

Na função de expertos temos basicamente as instituições que se dedicam ao ensino teórico-prático cujo objetivo deve ser a transmissão de elementos-chave para que o consumidor evolua na percepção de seu próprio perfil e alcance as razões que lhe dão confiança. Todavia a crítica é a de que o tecnicismo pode ser um fator que torna o aprendizado enfadonho.

Ideólogos e expertos são dois tipos de “intelectuais” dentro de uma dada esfera de conhecimentos, que em essência apresentam metodologias distintas com a finalidade de proporcionar a satisfação das necessidades dos que a eles se submetem.

Clérigos e mandarins dizem respeito à duas obras em que as ações de intelectuais são deturpadas: “La trahison des clercs” de Julien Benda e “American power and the new mandarins” de Noam Chomsky. Os clérigos de Benda puseram a intelectualidade à serviço do Estado Francês, desvalorizando princípios de justiça e tornando-se adoradores de falsos princípios (entendam como “falso” tudo aquilo que não resista à prova do tempo, que é circunstancial e pode desapareecer com as mudanças históricas). Os mandarins (burocratas do Estado Vietnamita) se referem aos intelectuais americanos que incentivaram a Guerra do Vietnã que acreditavam ser libertadora.

Os ideólogos renegaram seus valores e os expertos não dimensionaram as consequências de suas idéias.

O resumo é que há um conflito entre a metodologia pela qual poderíamos ajudar os iniciantes interessados em adquirir conhecimentos, que se vêem colocados dentro de uma incômoda dicotomia ao ter que optar por “doutrinadores” que na pior das hipóteses, pecam por “vender” ideologias (de fato, meras opiniões, pois estas “verdades” podem ser questionadas pelo conhecimento). Por outro lado, o tecnicismo cria uma zona abissal de transição, aventurada por poucos apaixonados.

Reconhecemos virtudes e falhas de ambos os lados e nos esforçamos para que possamos atingir o equilíbrio desejado. Afinal nas palavras de Émile Peynaud, para termos vinhos melhores precisamos de consumidores esclarecidos.

 

Crédito da imagem: site Zoomstart

 

Texto de autoria de André Logaldi, colaborador assíduo deste blog.

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