Governo e produtores de vinhos apresentaram em Brasília como estava previsto em 24 de abril de 2012, a documentação que busca anular a medida solicitada para limitar as quotas fixas de importação de vinhos do Chile, Europa e Estados Unidos, entre outros, ao mercado brasileiro. Uma medida, considerada protecionista pelo Chile, já que limitará o crescimento de seus vinhos neste importante mercado mundial nos próximos dez anos.

A documentação apresentada pelo Chile em particular (é importante saber que todos os países afetados estão trabalhando em bloco, unidos),  e de seu turno vez independente das apresentadas pelos setores governamental e privado; e se levou a cabo depois de cumprir-se os 40 dias impostos pelo DECOM (Departamento de Defesa Comercial do Brasil),  uma vez que este havia recebido o requerimento de salvaguarda  por parte de um grupo de produtores do Rio Grande do Sul, entre os que se encontram as associações  IBRAVIN, UVIBRA,  FECOVINHO e  SINDIVINHO.

Para entender a base da proposta de mais de 200 páginas apresentada por Vinos de Chile, em nome da indústria nacional com a ajuda de um escritório de advogados expertos em comércio exterior do Brasil e sua própria equipe no Chile, conversamos com René Araneda (presidente de Vinos de Chile) e Claudio Cilveti, seu novo Gerente Geral.

A BASE DA DEMANDA

O primeiro aspecto que devemos entender explica a dupla  base na qual se estabelecem os produtores do Rio Grande do Sul de que o vinho chileno é uma ameaça para sua própria produção de vinhos.  Araneda destaca neste ponto que se o Brasil é um mercado interno de 265  milhões de litros de vinho, os produtores de vinhos do Rio Grande somente incluem na sua demanda de salvaguardas 9  milhões de litros de vinhos finos; o que equivale a dois milhões de caixas.  Segundo explica Araneda, esta quantidade não tem relação alguma com a realidade, pois para chegar a ela se eliminaram o grande volume que formam os vinhos de mesa e os espumantes. “Isso no  Chile seria como dizer que não produzimos vinhos em tetrapak” argumenta a autoridade.  Os vinhos espumantes, merecem uma menção especial, porque sua produção no Brasil tem crescido, explicam,  de 4 a 13 milhões de litros nos últimos anos; e não estão incluidos neste total de vinhos finos, justamente  porque são caros, argumenta Araneda.

A realidade do mercado brasileiro de vinhos é que  86% de sua produção são vinhos de mesa.  “Quando estamos sendo afetados, afirma Araneda,  o importante é saber o tamanho real do mercado”.  Se aprovadas as salvaguardas,  se excluirmos  vinhos de mesa e os espumantes,  podemos dizer que apenas  3 % dos produtores brasileiros se beneficiarão.

Para termos uma referência, esses 9 milhões de litros que forman parte do segmento afetado segundo os produtores do RS, equivale à produção total de uma vinícola chilena como Misiones de Rengo, que não emprega mais de 200 trabalhadores, um dizimo do montante utilizado em toda a indústria de vinhos finos no Brasil.

Para que a salvaguarda seja acolhida explica Cilveti, os brasileiros devem demonstrar que houve uma evolução  imprevista das circunstâncias que resultaram  num aumento das importações, o que geraria um dano grave às vendas locais. A causa do dano ao mercado do Brasil se encontra na crise mundial  do ano 2008, nas qual todos países produtores exportadores viram no Brasil uma oportunidade para poder vender seus excedentes. Com isso acabaram saturando o mercado brasileiro.  Se os preços tivessem caído, acrescenta Cilveti,  mas não foi bem assim, mas o contrário.” Em vez de abaixar o preço do vinho aumentou cerca de 25%, evidenciado está que houve aumento na demanda e não na oferta.

A DEFESA

A defesa de Chile é que nosso crescimento no Brasil  tem acompanhado por igual o  resto dos mercados, sendo da ordem de 13% anual.  Neste mesmo contexto do imprevisto não se pode esquecer, acrescenta Araneda, o processo de Acordo de Complementação Econômica entre ambos países que se iniciou em 1996 e que conferiu um período de proteção  de dez anos à indústria brasileira e que posteriormente implicou numa  desoneração tarifária  dos vinhos chilenos que lhes permitiu passar de uma tarifa de 27% em 2006 a tarifa zero em 2010. Em contrapartida, o mesmo ocorrerá com a carne bovina brasileira.

Resultado? Os 4 milhões de dólares que  o Chile exportava em 1996 ao Brasil hoje alcançam 90 milhões; por  sua vez, os dois milhões que o Brasil exportava ao Chile de carne bovina, hoje alcançam 209 milhões de dólares. A conclusão é clara, salienta Araneda, o acordo subscrito por ambos os países tem sido exitoso e tem favorecido fortemente as exportações brasileiras a nosso país.  Claramente, agrega Araneda,  os brasileiros não poderão dizer que um tratado firmado faz tantos anos não era previsível… “Para que se receba uma demanda de salvaguarda a nível internacional,  tem  que haver mudanças imprevisíveis das circunstâncias e que isso incremente o aumento das importações”,  diz Cilveti.

Mesmo com a tarifa zero para o vinho chileno, nos impuseram depois os selos com a desculpa de evitar o contrabando. “Pouco a pouco o Brasil tem adotado as mais diversas medidas protecionistas”; ante a exigibilidade do selo fiscal uma das  associações  de importadores brasileiros (ABBA) impugnou em Juízo e está ganhando em várias instâncias. A questão deverá ser solucionada definitivamente por um dos tribunais de Brasília.

Cabe destacar que a demanda é contra  todos os países que o Brasil importa vinhos,  exceto Argentina e  Uruguai por ser do MERCOSUL;  e Israel por seu ínfimo tamanho. A Argentina, então hoje com 24% do mercado,  claramente será beneficiada da situação.  Chile, no entanto, possui  36.6%, enquanto que  todos os países europeus liderados por Itália e Portugal somam o mesmo que o Chile.

Mais cifras… O total das importações de vinho do Brasil são de 71 milhões de litros. A comercialização de vinho brasileiro são 260 milhões (de vinhos finos são 19 milhões). Isso quer dizer que apenas 20% seria o mercado de vinhos importados.

Fica claro a essa altura, diz Araneda, que no Brasil o grande consumo é de vinhos massivos com preços baixíssimos e que essa grande parcela de consumidores não é a que que toma vinhos finos. Então, argumenta, não há equivalência entre esses vinhos baratos e o preço dos importados,  segmento que finalmente se pretende proteger.

A EQUIPE

O importante para a indústria de vinho chilena é que não está se defendendo sozinha. O Governo tem trabalhado o tema com sua equipe de primeiro nível desde o ponto de vista dos tratados internacionais de alcance internacional. E a razão é simples, se o Brasil ganhar com o vinho poderá tomar medidas protecionistas semelhantes com outros produtos chilenos.

O parágrafo anterior resulta difícil de compreender, porque o  Brasil é quarto sócio comercial de Chile a nível mundial, o que é o reflexo de uma fluída relação comercial de longa data entre ambos países. Este comércio bilateral Chile-Brasil soma 11 milhões de dólares, estando US$ 2 milhões de saldo ao  Brasil.

O APOIO INESPERADO

Há esperança para desistência da demanda?  O Governo do Chile tem assegurado que o tema já é prioritário na agenda bilateral dos dois países e por outro lado, tem surgido o inesperado apoio dos donos de restaurantes do Brasil.  Segundo contam os diretores de vinícolas do Chile, dentro do Brasil tem havido uma reação positiva para os vinhos do Chile e Europa, do que chamam de movimentos cidadãos. O setor de restaurantes, incluindo os sommeliers,  conta Cilveti, estão  contra a demanda porque diminui a diversidade de opções para seus clientes.  Inclusive o Chef mais famoso do Brasil retirou os vinhos brasileiros de sua carta e o mesmo está sendo feito por outros restaurantes.

O PIOR CENÁRIO

Que acontece se apesar de todos esses argumentos as salvaguardas do Brasil ganharem? Araneda explica que se estabeleceram cotas, quer dizer que somente hoje exportamos 26 milhões de litros, no melhor dos casos devemos seguir vendendo o mesmo durante uns dez anos. O que claramente  vai limitar nosso crescimento.

Todo o processo, diz Araneda,   demora uns cinco ou seis meses. O positivo é que  nesse período não se podem adotar medidas provisórias, como foi confirmado pela Secretária de Comercio Exterior do Brasil, Tatiana Lacerda, no encontro havido com o Diretor de Decom, na exposição de planejamento  do Chile na reunião de 25 de abril em Brasilia. “Estes meses já estabeleceram licenças de importação que demoram 60 dias, mas ainda assim  está funcionando bem”.

O negativo? A Presidente do Brasil, Dilma Rousseff,  vem da zona de Rio Grande do Sul e há muita pressão política desde o interior para que se aceite as salvaguardas, o que implicaria que os argumentos de comércio serão muito fortes e a solução de índole política.

Ganhando as salvaguardas, com serão repartidas as quotas? Aí entra 0 período de negociações que pretendemos evitar, explica Araneda, segundo as importações dos últimos 3 anos. Teremos inúmeros relatórios,  segmentos de preços diferentes e o conluio pode ser enorme, tremendo. Há, ademais, as reclamações dos importadores.

O pior que pode acontecer? Que ponham salvaguardas ao salmão e outros produtos chilenos! Existe uma demanda interna por protecionismo, por isso, salienta Cilveti, esta demanda contra o vinho chileno se  converteu num caso histórico e emblemático para o Ministério das Relações Exteriores do Chile.

Texto extraído do portal chileno Planetavino.com, de lavra de Mariana Martínez, vertido para o português por Jeriel.
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