A Merlot é uma casta controversa, pois dependendo de como é cultivada pode produzir desde vinhos simples e ralos, até verdadeiros monumentos. De origem francesa e plantada nos quatro cantos do mundo é uma casta muito utilizada para elaborar vinhos de corte, bem como produzindo vinhos varietais. Nos vinhos de corte é presença garantida em quase todos os grandes vinhos de Bordeaux, mais notadamente nos vinhos do Médoc e Graves. Todos os Premieur Grand Classé da classificação de 1885 tem em seu blend a Merlot. Sem duvida nessas duas regiões a Merlot é sempre a coadjuvante ao lado da Cabernet Franc e Petit Verdot  (as vezes Malbec), onde a Cabernet Sauvignon reina absoluita e é a casta principal. No Medoc onde está incrustada Appelation D’Origine Controlée (AOC) de Paulliac, a Meca do Vinho, os clássicos Premieur Grand Classé como o Chateau Latour, Chateau Mouton e Lafite Rothschild tem a Merlot em seu blend. Medoc e Graves são denominadas regiões vitivinicolas da Margem esquerda do Rio Gironde. Poucos quilômetros Rio Gironde abaixo, para dentro do continente, esse Rio se divide em dois, o Garonne e o Dordogne. Logo após a cidade de Libourne temos na, Margem Direita do Dordogne, duas AOC’s onde a Merlot é mais presente, são elas Saint Emilion e Pomerol.

Em Saint Emilion faz parceria com a Cabernet Franc e em Pomerol, reina absoluta, sendo utilizada na maioria das vezes como a casta predominante. Além dessas duas AOC’s e seus satélites, a Merlot predomina em Bordeaux nas AOC’s de Fronsac, Bourg e Blaye. De acordo com o senso de 1988 na região de Bordeaux a Merlot tinha metade da plantação dentre as castas tintas. A 2ª Casta mais plantada na região com 28% na ocasião era a Cabernet Sauvignon. Especificamente no Médoc de cada duas vinhas plantadas uma era Cabernet Sauvignon, enquanto que em Saint Emilion e Pomerol tinhamos 2 videiras de Merlot em cada 3 plantadas. Essa tendência sofreu algumas mudanças nos últimos anos com um maior foco no aumento da plantação da Cabernet Sauvignon, principalmente no Médoc, mas sem muitas mudanças de maneira geral, sendo ainda a Merlot a casta tinta mais plantada em toda Bordeaux. O vinho de Bordeaux mais caro e disputado do Planeta é um Merlot Puro, o famosíssimo Petrus. De maneira geral o Petrus é um vinho que precisa de muitos anos em garrafa para mostrar todas as suas qualidades.

A Merlot, sua origem, características, solo e clima ideal

Ainda não existem comprovações que confirmam em 100% a origem da casta, mas é claro o reconhecimento de que a mesma é de origem Bordalesa. Uma das primeiras menções da Merlot data de 1784 onde um oficial local chamado Faurveau destacou a Merlot como uma das melhores castas da Região de Liborunais, na margem direita do Dordogne. Poucos anos antes, em 1868, A. Petit Lafite classificou a casta como a principal para ser blended com a Cabernet Sauvignon. A plantação mais consistente da Merlot na margem esquerda se iniciou em meados do século XIX. Por volta desse mesmo período do século XIX a casta também começou a ser plantada na região do Veneto na Itália, de onde o primeiro registro data de 1855. No inicio do século XX a casta chegou ao Cantão de Ticino na Suiça. Seu nome deriva segundo alguns estudos de um pássaro negro chamado Merle (Black Bird – Turdus merula), cujo dinimutivo é Merlot, talvez pela sua cor muito escura. Ainda existem registros de que o pássaro em questão aprecia frutas doces de maturação avançada, como um bago de Merlot maduro.

A Merlot é uma variedade que possui uma casca mais fica se comparada com a Cabernet Sauvignon, é menos resistente a solos frios e normalmente amadurece algumas semanas (normalmente 2 semanas) antes que a Cabernet Sauvignon. Por essa razão se adéqua de maneira destacada em solos com maior quantidade de Argila, como os de Libournais, onde a argila é predominante no solo. De maneira geral a região de Libournais, Margem Direita, é mais quente que o Médoc, do lado esquerdo. É uma casta mais sensível a doenças como Coulure e podridão e finalmente é mais sensível a geadas mais fortes.

Normalmente, dependendo de como é cultivada, a Merlot produz vinhos com taninos de média intensidade. Sempre concede carga de frutas vermelhas e negras. Quando é cultivada em climas mais quentes concede aos seus vinhos a fruta negra mais intensa e toques de chocolate. Se não manuseada adequadamente e principalmente quando é colhida antes de sua plena maturação, concede tons muito herbáceos, verdes, a seus vinhos.

Os Grandes Merlot de Pomerol e Saint Emilion

De Pomerol temos os excepcionais tintos: Chateau Le Bon Pasteur, Certain de May, Clinet, L’Egilse Clinet, L’Evangile, La Fleur-Petrus, Lafleur, Le Gay, Le Pin, La Tour-à-Pomerol, Trotanoy e Vieux Chateau Certain, todos com a Merlot predominante, com a porcentagem variando entre 60% e 90%. O corte mais comum nesses vinhos é 80% de Merlot com 20% de Cabernet Franc. Alguns levam um toque de Cabernet Sauvignon, nunca ultrapassando mais de 10%. Nenhum desses vinhos é um Merlot puro. Os Merlot puros mais reluzentes dessa AOC são o já mencionado Petrus e o sensacional La Fleur de Gay. Anos atrás o Petrus tinha em seu corte um pouco de Cabernet Franc, mas já alguns anos é produzido com 100% de Merlot.  De Saint Emilion temos grandes vinhos com a Merlot como base, mas em quantidades menores, na maioria dos casos em se comparando com os tintos de Pomerol. Duas das mais espetaculares estrelas de Saint Emilion, ao lado do Cheval Blanc (Cabernet Franc predominante), o Chateau Ausone e o Chateau L’Angelus tem em seu blend cerca de 50% de Merlot. Os clássicos e sensacionais Chateau Beau-Séjour Bécot e Béauséjour Duffau Lagarosse são Merlot predominante (~70%). Canon, Canon-La-Gafelière, Clos Fourtet, Clos L’Oratoire, Couvent des Jacobins, La Dominique, La Mondotte, Pavie, Pavie-Decesse, Pavie-Macquin, Quinault-L’Enclos, Tertre-Roteboeuf, Troplong Mondot e Valandraud, são todos tintos de classe mundial que tem em sua alma a Merlot, sempre como casta predominante.De Saint Emilion o mais destacado Merlot puro é renomado e raro La Gomerie.

A Merlot no restante da França

Fora de seu berço, Bordeaux, a Merlot que é 3ª mais plantada casta vinífera no País, somente atrás da Carignan e da Grenache, brilha no Languedoc Roussillon e Bergerac.  Para se ter uma idéia, no mesmo senso de 1988, citado acima, tínhamos cerca de 60.000 hectáres de Merlot plantados contra apenas 36.500 de Cabernet Sauvignon. Ao lado da Syrah, a Merlot tem sido a casta mais plantada no Midi. São cerca de 5.000 hectares plantados no departamento de Aude e L’Herault, onde a casta é parte integrante da maioria dos blends dos grandes vinhos.

A Merlot na Itália

Quando saímos da França, é da vizinha Italia, que podemos encontrar grandes vinhos a base da casta Merlot e, ainda mais, podemos afirmar que hoje os melhores Merlot in purezza do mundo são mesmo desse país, principalmente se não compararmos com o citado Petrus e levando em consideração, que a maioria dos grandes vinhos de Pomerol e Saint Emilion são, sempre Merlot predominante, mas raramente puros. A Merlot na Itália é muito difundida no Veneto, mas na maioria das vezes nessa região, produz vinhos de volume, sem muita expressão. Na região vizinha do Friuli Venezia Giulia a coisa é bem diferente. Temos nessa região tintos a Base de Merlot e, muitos in purezza, absolutamente sensacionais. Os produtores Miani, Villa Russiz, Volpe Pasini, Livio Feluga e Vie de Romans, por exemplo, produzem vinhos de classe mundial com a Merlot “Friulana”. Partindo do norte para o sul, mais especificamente na Toscana, encontramos os mais badalados Merlot do mundo, sem duvida nenhuma. O mais interessante é que temos Merlot de exceção tanto no centro da Toscana, quanto na costa. Não há como negar que é na costa da Toscana, em Maremma e Bolgheri, que temos a mais importante plantação de castas bordolesas fora da França. Na costa da Toscasna brilham sobremaneira a Cabernet Sauvignon, a Merlot, a Cabernet Franc e a Petit Verdot.

Do centro da Toscana um dos mais renomados produtores de vinhos da região do Chianti ,de alta gama, o Castello Di Ama, comandado pelo simpático e habitue de nosso país, Marco Pallanti, temos um vinhedo único denominado L’Apparita. Desse vinhedo de Merlot temos todo ano um dos mais renomados Merlot do mundo, o Castello di Ama Vigna L’Apparita, um primor de tinto. Ainda da costa da Toscana temos os mais caros e disputados Merlot puros do planeta (sem considerar Petrus e La Gomerie, por exemplo). Seus preços são mesmo altos, mas se comparados com os vinhos de Pomerol, sinceramente estamos falando de vinhos de muito melhor value for Money. Nessa região temos obras de arte como o Le Macchiolle Messorio, o Tenuta Del’ Ornellaria Masseto e o Tua Rita Redigaffi. Alias foi esse último vinho a inspiração para elaboramos essa matéria dedicada a essa tão especial casta. Ainda na Itália temos grandes Merlot do Lazio e da Campania. No Lazio, o competente enólogo Ricardo Cottarella, produz um grande Merlot chamado Montiano e na Campania ,mais ao sul da Itália, a casa Feudi de San Gregório produz o bombástico Pàtrimo.

A supreendente Merlot do Norte da Espanha

A moderna Bodegas Irius, Somontano, Nordeste da Espanha – imagem de LGB

Na Espanha ,onde Garnacha e Tempranillo dominam, temos em três regiões, verdadeiros achados quando falamos de proeminetes Merlot. Navarra e Somontano são duas dessas regiões. A segunda ao pé dos Pinineus tem uma impressionante plantação da casta e produz vinhos de diversos níveis, mais não tem muitos Merlot predominantes ou puros. Do Somontano os mais destacados são O Merlot Merlot da Enate e o Absum Collection da Bodega Irius.

Já em Navarra onde temos poucos hectares plantados, temos dois produtores, que dedicam um carinho especial a Merlot. A Casa Julian Chivite, a mais badalada da região, produz um delicioso Merlot, com cultivo biológico. A vizinha Viña Magaña produz um superlativo Merlot, que foi também uma grata surpresa em nossa degustação as cegas. Um grande vinho. A terceira região que tem muitos hectares plantados da Merlot é o Penèdes que tem bons Merlot puros, com destaque para o Atrium Merlot da família Torres, que é um bom custo beneficio. O grande Merlot do Penèdes é o extraordianrio Caus Lubis do produtor Can Rafols dels Caus. Um tinto sensacional que pode evoluir por muitos anos na garrafa.

A Merlot nas Américas

Campos de Lavanda na Matanzas Creek em Sonoma, California, EUA

A casta Merlot tem importante presença nos Estados Unidos. É muito difundida na Califórnia, com destaque para o Napa Valley, onde temos excepcionais exemplares. Mais ao norte do país no estado de Washington, mais especificamente no Columbia Valley, podemos encontra preciosidades. Temos ainda a casta plantada em um sem numero de outros estados. Se você tiver viagem marcada para a América e quiser trazer umas garrafas de excepcionais Merlot, tente Duckhorn, Pahlmeyer, Paloma, Matanzas Creek e Beringer, do Napa Valley, e Leonetti e Quilceda Creek, do Estado de Washington.

Dos grandes Merlot da California provados os mais especiais são o Duckhorn Three Palms, o Beringer Howell Montain e o Matanzas Creek Journey, sendo esses 2 últimos produzidos em vinícolas sensacionais. A Beringer esta localizada nas cecarnias de Santa Helena, no Napa, já a segunda, incrustada no coração de Sonoma, em meio a uma espécie de Jardim Botânico, repleto de flores. É endereço certo para os amantes do vinho e da beleza natural. Um must para quem visitar a mais customer driven wine region do planeta, a Califórnia.

Na América do Sul temos a Merlot plantada em diversos países. Na Argentina tem papel importante, mas como por lá só dá Malbec, a Merlot ficou um pouco no esquecimento. O interessante é que além de termos a Merlot presente em Mendoza, a casta vem ganhando espaço no Sul, mais especificamente na Patagonia, de onde estão surgindo destacados tintos. No Chile tem presença marcante, mas com o advento da “confusão” local entre Merlot e Carmènere, a Merlot perdeu um pouco de seu brilho, mas temos grandes exemplares de Merlot da terra de Pablo Neruda. Tem importante presença em vários vales do país desde o Limarí até o Maule.

Grandes nomes do Chile como a Casa Lapostolle produzem excelentes Merlot, com destaque para o Cuvée Alexandre, um dos melhores do país. Além desse tinto temos excelentes exemplares de produtores como Viña Santa Rita, Gillmore, Calina, Veramonte e Viña Casablanca. Finalmente no Uruguai temos uma importante quantidade de hectares plantados, mas nesse nosso viznho quem dita o ritmo é a Tannat.

A Merlot no Brasil

Em solo brasileiro a casta tem suma importância produzindo tintos de diversas categorias. Se formos a fundo, a Merlot,  disputa com a Cabernet Sauvignon, a posicão de casta tinta mais importante do Brasil. Os melhores Merlot de nosso país são provenientes do Rio Grande do Sul. Miolo e Valduga, por exemplo, produzem vinhos à base da casta com marcante destaque. O vinho TOP ou Flagship tanto de Valduga quanto de Miolo, é a base da Merlot, da Denominação de Origem Vale dos Vinhedos. São eles o Storia da Casa Valduga e o Merlot Terroir da Miolo.

A Merlot no Resto do Mundo

A Merlot se destaca ainda em três importantes países, são eles a Australia, a Nova Zelândia e a África do Sul. Na Austrália a casta brilha em varias regiões desse imesno país. Podemos encontrá-la com mais freqüência em cortes do que em varietais, mas mesmo assim podemos disfrutar de bons Merlot puros. Os produtores de maior destaque são Capel Vale, Clarendon Hills, Pepper Tree, Petaluma, Tatachilla e Yarra Yering. Na Nova Zelândia tem presença nas Ilhas Norte e Sul. Os produtores de destaque no cultivo e produção de bons Merlot são Brookfileds, Kim Crawford, Goldwater e Sileni. Na África do Sul a casta tem resultados surpreendentes em Stellenbosch e Paarl. Boekenhoutskloof, Morgenhof, Saxenburg, Spice Route, Thelema, Vergelegen e Veenwouden, são os que mais brilham com seus Merlot. Esse último produziu excepcionais Merlot puros, que podem estar entre os grandes Merlot do mundo. Infelizmente seu proprietário faleceu anos atrás e nunca mais tivemos o brilho de antes.

Matéria e ilustrações do colaborador Luiz Gastão Bolonhez, originariamente publicada no portal ppow.com.br

(Visited 538 times, 538 visits today)

2 thoughts on “Merlot, uma grande casta”

  1. Já tomei vinhos da Saxenburg e da Thelema. São simplesmente fantásticos. Da Saxenburg eu já bebi o Cabernet. E da Thelema eu bebi um Merlot de 2000 (ou 2002, não lembro direito), que entra fácil no meu TOP 10 dos tintos de toda a vida.

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *