Recentemente na região vinícola da Rioja ocorreu algo que pode ser considerado um escândalo: a vinícola Artadi fez suas malas para ir-se da D.O. Rioja. Esta decisão corresponde a uma iniciativa do mesmo gênero capitaneada por Raventós i Blanc quando saiu da D.O. Cava faz um ano, assim como Gutiérrez de la Vega da D.O. Alicante. Aproxima-se o fim das Denominações de Origem Espanholas? Eu creio que devem adaptar-se aos novos tempos.

artadi

A razão está muito clara: as D.O. são demasiadamente grandes para determinar o caráter de um vinho. Na reportagem de Víctor de la Serna se explica claramente: http://elmundovino.elmundo.es/elmundovino/noticia.html?vi_seccion=10&vs_fecha=201412&vs_noticia=1420022586

Segundo palavras de Juan Carlos López de Lacalle, proprietário da Bodega Artadi: “A D.O. sempre ajuda a vender mas também homogeneiza e cria distorções. Na Rioja, existe uma Denominação de Origem que nivela a todos por igual, sem distinguir zonas, solos, vinhedos nem vinhos na qual únicamente o tempo de amadurecimento diferencia a uns dos outros. O reputado bodeguero riojano se refere à necessidade de antepor o nome do município, o solo e o microclima ao critério puramente genérico da D.O. estabelecido por interesses sócio-econômicos.  O critério de amadurecimento foi determinante quando se criaram a maior parte das D.Os. Houve apenas uma demarcação geográfica onde se implantaram normas rígidas que eram válidas durante os anos noventa e que, na atualidade, já não tem razão de ser. Hoje, alguns vinhos alcançaram níveis mais elevados de qualidade, portanto, se faz necessário mais do que nunca, aprofundamento no caráter e personalidade do vinho que só se transmite pelas parcelas, variedade integrada nelas e o microclima de microterroirs. Mas não é só isso. Não somente se debatem as peculiaridades dos terroirs únicos e seus respectivos municípios, também deve dar-se a conhecer uma ordem hierárquica de qualidades numa mesma D.O. É possível que algumas vinícolas das zonas oficiais não atinjam altos níveis de qualidade, mas é importante que sejam refletidas as diferenças geográficas dentro da denominação e valorações de qualidade de uma marca, em vez de colocar todos os vinhos no mesmo nível, como ocorre na atualidade. Não é aceitável que as D.O. transmitam uma mensagem de qualidade com o mesmo contrarrótulo num vinho de 2 € e de 150 €.

Deste assunto falo e escrevo desde 1993, sobre as vantagens e desvantagens das D.O. Em meu post de 26.11.2011 http://jpenin.guiapenin.com/2011/11/26/%c2%bflas-denominaciones-de-origen-significan-calidad/ deixo claro que as D.O. nasceram na França no primeiro terço do século XX num momento de necessidade ante a enorme fraude dos vinhos pós-filoxéricos. Criaram-se na mesma senda do exitoso modelo dos Grand Cru Classé de 1.855. Esta fórmula, na realidade, projetava a peculiaridade da marca em sua relação com o solo, enquanto que as D.O. que se criaram na Espanha, acabaram convertendo-se em gigantescos consórcios socio-econômicos. Vale dizer, promovendo todos sem diferenciar qualidades. Recordo uma entrevista que fiz com Émile Peynaud em 1982 quando disse que era inconcebível que não existira na Rioja tantas ou mais “apellation d´origine”. Peynaud afirmou que em Bordeaux devido às enormes diferenças entre vinhedos e municípios vários eram as “apellation d´origine”. Respondi-lhe que isso era impossível ante à condição tão espanhola de misturar vinhos de distintos municípios. Nesse momento Peynaud quedou pensativo e me disse: “Ah, os franceses que vieram para la Rioja foram “negociants” que se instalaram no último terço do século XIX comprando vinho daqui e de acolá e elaborando-os em suas bodegas. As vinícolas históricas riojanas que ficaram com os armazens franceses seguiram fazendo o mesmo. Mas se tivessem vindo para La Rioja os “recoltants” ou proprietários de châteaux eles teriam dado ênfase na distinção de parcelas e cidades”. Fiquei pasmado. Indubitavelmente Peynaud sabía que a D.O. Rioja foi traçada incluindo os municípios sede das bodegas históricas e não por alguma outra característica global. O próprio slogan atual “La Rioja de los Mil Vinos” não deixa de ser um eufemismo. A iniciativa de Telmo Rodríguez na Rioja de potencializar o vinho de Labastida e de Álvaro Palacios, Mas d´Gil e Josep Lluis Perez Verdú no Priorato com o nome de “vi de vila” estão focadas no desenvolvimento do vinho do município. As Denominações de Origem nem sequer seguiram com esta tradição desde as Ordenanças Reais do século XV que protegiam a identidade e comercialização dos vinhos municipais, os quais concretaram muito mais as peculiaridades do terroir local.

No post http://jpenin.guiapenin.com/2013/08/04/los-vinos-de-los-pueblos/ enfatizo a importância histórica dos vinhos dos povoados nos quais se implataram as D.O. Em Bordeaux convivem perfeitamente os vinhos municipais como Saint-Estèphe, Pauillac, Margaux ou Saint Émilion com appellations contrôlées, como Haut-Médoc, Entre-Deux-Mers, Graves e o genérico Bordeaux e todos tem claro de onde vem as marcas valorizadas.

As Denominações de Origem têm razão de ser se contemplarem a hierarquia de atributos de cada marca, o que justificaria os preços altos dos principais rótulos e os preços baixos dos níveis inferiores. Tudo isso indicado no contrarrótulo das garrafas. Por outro lado e para as bodegas que o desejem, é absolutamente compatível com o conceito atual das D.O.  a indicação local do vinhedo ou do município no que respeita à identidade específica do lugar. A vantagem atual das Denominações de Origem é inerente a promover grupos que, individualmente, lhes resulta mais difícil dar-se a conhecer. Saem ganhando as novas bodegas e as produções até os 8 €, enquanto que continua negativo para os vinhos de alta gama por obrigar a multiplicar os esforços em justificar seus elevados preços para vender um produto que leva a mesma indicação de origem de um de 2 €.

Numa D.O. como La Rioja, com uma estrutura exemplar de inspetores e com um controle rigoroso de vinhedos, rendimentos, qualidades e também – como não – em questões menos relevantes como o amadurecimento, seria tão complicado incluir no contrarrótulo as categorias de qualidade, “pagos” e uma resenha dos locais de origem?

José Peñín, nascido em 1943, em Santa Colomba de la Vega (León). É o escritor de vinhos mais prolífico da Espanha e um dos jornalistas e escritores mais experientes em matéria vitivinícola, decano da profissão e o mais conhecido a nível nacional e internacional. Desde que criou em 1990 o “Guia Peñin”, tornou-se referência mais influente no comércio internacional de vinhos espanhóis e sua publicação a mais consultada a nível mundial, o que o converte no mais importante criador de correntes de opinião em torno do vinho. Viajante incansável, já visitou quase todos os principais vinhedos do mundo, amiúde convidado para ser conferencista, consultor, degustador de reconhecido prestígio, membro de diferentes corpo de jurados internacionais com inumeráveis prêmios em sua trajetória profissional que alcança na atualidade mais de 35 anos na atividade vitivinícola. Fonte: http://jpenin.guiapenin.com/
José Peñín, nascido em 1943, em Santa Colomba de la Vega (León). É o escritor de vinhos mais prolífico da Espanha e um dos jornalistas e escritores mais experientes em matéria vitivinícola, decano da profissão e o mais conhecido a nível nacional e internacional. Desde que criou em 1990 o “Guia Peñin”, tornou-se referência mais influente no comércio internacional de vinhos espanhóis e sua publicação a mais consultada a nível mundial, o que o converte no mais importante criador de correntes de opinião em torno do vinho. Viajante incansável, já visitou quase todos os principais vinhedos do mundo, amiúde convidado para ser conferencista, consultor, degustador de reconhecido prestígio, membro de diferentes corpo de jurados internacionais com inumeráveis prêmios em sua trajetória profissional que alcança na atualidade mais de 35 anos na atividade vitivinícola. Fonte: http://jpenin.guiapenin.com/
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