No 2º semestre de 2011 publicamos nessa seção uma matéria denominada  “Degustação às cegas: um exercício de humildade”. Todos nós, apreciadores e apaixonados por vinhos, temos que ter nossos guias e referências, mas o mais importante é conhecermos nosso gosto, independentemente de qualquer influência. Beber um vinho com o rótulo a vista é bom demais, principalmente quando realizamos um desejo. É muito bom degustar um Chateau Latour. É uma experiência incrível, que enche nossa alma de alegria, pois estamos à frente de um vinho dos sonhos, histórico e que na maioria massiva das vezes é sempre divino, marcante e inesquecível. Por exemplo, já degustei esse vinho de diversas safras, incluindo safras muito difíceis, e mesmo assim o vinho estava sublime. Talvez esse seja um dos vinhos especiais e mais regulares do planeta.

Mas, quando queremos mesmo entender e desafiar a mística do rótulo, é indicado realizar degustações às cegas, principalmente com temas mais específicos. Realizar uma degustação às cegas de, por exemplo, tintos e tão somente tintos “misturando” um delicado Pinot Noir da Borgonha, com um blockbuster Malbec Argentino e com um Cabernet Sauvignon Sul Africano, por exemplo, é tarefa complexa e pode desvirtuar o objetivo principal, que é a comparação.

Vista aerea da Azienda Agricola Tua Rita em Suvereto

No ano passado nossa matéria em questão abordou uma vertical, ou seja, degustamos o mesmo vinho de diversas safras. Foi uma experiência incrível. As verticais servem muito para compreender o significado de um safra em relação a outra. Nesse ano, os mesmos “loucos” por vinhos, depois de muitos estudos decidiram fazer um tema mais profundo e complexo. O tema “Merlot in purezza”, ou seja, escolher Merlot puros da Itália. Importante ressaltar aqui que a Merlot é uma casta de origem francesa e que na sua origem, em Bordeaux, dificilmente é encontrada em vinhos varietais, ou seja, 100% Merlot. O Mais famoso Merlot puro do mundo hoje é o Petrus de Pomerol, uma apelação controlada da grande Bordeaux. Em Pomerol, berço da Merlot, é muito difícil encontrar além do Petrus, varietais da casta em questão. Em contrapartida na Itália onde a casta é muito difundida, podemos encontrar Merlot puros do Sul ao Norte. No sul, mais especificamente na Campania, temos alguns bons exemplares, na Costa Toscana e na Toscana Central, encontramos os mais requintados, caros e raros Merlot da bota e por último, temos no Friuli uma importante plantação de Merlot (há também boa presença da casta no Veneto, mas com vinhos menos expressivos).

Pois bem o decano de nossa confraria, um fã confesso de vinhos italianos, escolheu a dedo 4 dos mais destacados Merlot da Itália, todos de importantes/destacadas safras, são eles: O disputadíssimo e adorado na América do Norte Masseto 2004 da Tenuta Dell’Ornellaia, o sensacional e marcante Messorio 1999 da casa Le Macchiole, o exuberante e riquíssimo Redigaffi 2001 da Azienda Agricola Tua Rita e ,por último, o Vigna L’Apparita 1997 do Castello di Ama. Os três primeiros vinhos são da Costa Toscana e o último, da Toscana Central (Chianti).

Esses 4 vinhos são talvez os mais disputados e caros dentre todos os Super Toscanos, com seus preços variando aqui no Brasil de 700 a 2.000 reais a garrafa de 750 ml. Relativamente às safras, sem dúvida, são essas safras as mais importantes da Toscana nos últimos vinte anos (aqui não levamos em consideração as safras mais recentes como 2006, 2007 e 2008, por considerarmos que os vinhos ainda estão muito jovens para uma disputa como essa). Depois dessa escolha que sem duvida colocava na mesa os Melhores Merlot puro da Itália e quiçá do mundo, decidimos colocar um outsider, obviamente também italiano, à mesa. O escolhido para representar a região do Friuli-Venezia-Giulia foi o Focus Zuc di Volpe 2004 do renomado produtor Volpe Pasini.

Vale aqui ressaltar um ponto sobre as safras. Decidimos mesmo por safras dispares, pois queríamos também nessa degustação tirar algumas dúvidas sobre esses espetaculares anos na Toscana (1997, 1999, 2001 e 2004). Quanto a safra 2004 no Friuli, também tivemos um excelente ano para tintos.

Tudo pronto e estávamos lá, preparados com todos os vinhos servidos em taças numeradas de 1 a 5. Éramos sete enófilos inveterados e ávidos para poder degustar esses cinco grandes tintos. Somente um, no caso seu colunista, sabia da ordem dos vinhos servidos, e por isso fiquei fora da votação e eleição final dos melhores da noite.

As amostras foram por mim organizadas de maneira aleatória, com o objetivo de não deixar muitas pistas. A primeira amostra foi a que menos brilhou e a conclusão que chegamos foi que o vinho tinha algum problema e por isso ficou fora da avaliação final. Foi mesmo um azar, pois estávamos a frente do Castelo di Ama Vigna L’Apparita 1997. Um vinho que degustei diversas vezes, sendo a última vez aqui em São Paulo, ano passado, com o proprietário da casa, o simpático e competente Marco Pallanti. Vale ressaltar que a safra de 1997 na Toscana foi considerada no final do século passado como a safra do século na região. No ano 2000 a renomada revista americana Wine Spectator elegia pela 1ª vez um vinho Italiano como o Wine of the Year. O eleito foi um Toscano da safra 1997, o Solaia, da Tenute Antinori. Na taça numero 2 tínhamos o Tua Rita Redigaffi 2001.  Um vinho muito potente, que disputou o titulo de mais encopado com a amostra numero 5, que vamos abordar a seguir. Seus aromas eram muito marcantes com a fruta negra madura exuberante, seguido de tons especiados e boa presença de carvalho novo.

Um grande vinho, que tem estrutura para evoluir por mais 10 anos seguramente. Foi meu medalha de bronze. A amostra numero 3 foi a que menos de menos densidade e viscosidade mostrou dentre todos. Mais fino na acepção da palavra e coincidentemente menos potente em boca, apesar de apresentar uma boa carga de madeira, fruta abundante e um final muito saboroso. Estávamos a frente do Volpe Pasini Zuc di Volpi Focus 2004. Esse foi meu 2º lugar, levando a medalha de prata. Um tinto realmente delicioso, que está mais acessível hoje que todos do painel, com exceção do numero 4 (também muito pronto), mas que ainda tem bom tempo de evolução em garrafa.

A 4ª amostra era um vinho reluzente, inebriante, com taninos finos e de extrema elegância. Sua complexidade e profundidade aromática marcaram muito. Realmente sublime no conjunto aromático. Inesquecível. Como para mim a degustação não foi às cegas, foi meu favorito, e medalha de ouro de todo painel. Estamos falando do sensacional Messorio 1999, elaborado pelo Genial enólogo Carlo Ferrini, um dos maiores especialistas de toda a Itália e sem duvida o enólogo de mais prestigio em toda Toscana. A última amostra era o vinho mais blockbuster desse painel. Todos seus quesitos como madeira, fruta, álcool e densidade, estavam no “patamar superior”. Para quem aprecia vinhos com muito corpo é uma excelente pedida. Ficou um tanto quanto fora do painel, pois realmente foi de maneira quase unanime eleito com o mais “pesado” vinho da noite.

Panorâmica da Azienda Volpe Pasini no Friuli

O resultado depois da apuração consolidando os 6 “jurados” foi:

Amostra Numero 1

Castello di Ama Vigna L’Apparita 1997

Ficou fora da avaliação.

Amostra Numero 2

Tua Rita Redigaffi 2001

Um 1º, dois 2ºs e três 3ºs.

Amostra Numero 3

Volpe Pasini Zuc di Volpi Focus 2004

Três 1ºs, um 2º e um 3ºs.

Amostra Numero 4

Le Macchiole Messorio 1999

Dois 1ºs, dois 2ºs e dois 3ºs.

Amostra Numero 5

Tenuta Dell’Ornellaia Masseto 2004

Um 2º lugar.

Vale ressaltar que meus votos não foram considerados nessa contagem.

Conclusões:

São muitas, mas de maneira simples podemos “Dizer” que o vinho mais Caro, o Masseto 2004, foi uma grande decepção e o Focus 2004 a grata e especial surpresa.

Resultado Final da degustação às cegas de Merlot in purezza:

Medalha de Ouro – Volpe Pasini Zuc di Volpi Focus 2004

Medalha de Prata – Tua Rita Redigaffi 2001

Medalha de Bronze – Le Macchiole Messorio 1999

Texto de autoria do colaborador Luiz Gastão Bolonhez, originariamente publicado no portal ppow.com.br

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